01/09/2020

Carta de um ex-suicida

Ana Carolina Carvalho

 A você que pensa em tirar a própria vida, respira eu sei como é. Eu já estive desse lado, no parapeito da janela, com o gás aberto e o fósforo na mão, com os pulsos a sangrar. Já desencapei fio e com os pés molhados cheguei a tocar nele, mas não obtive êxito. Ainda bem. Entendi com o tempo que eu nunca quis tirar minha própria vida, mas quis acabar com a dor.

Reconhece semelhança? O problema é que não entendem. Acham que é para chamar a atenção. Que é loucura, passamento, falta de surra e o pior de todos frescura. E não entendem mais ainda que isso só faz piorar a situação. A dor que a incompreensão causa faz aumentar a dor que já é latente de se sentir incompreendido, incapaz, burro, sujo, mal amado. Mal amado do amor externo e mal acolhido internamente.

Porque dói de tantos lugares que é quase impossível saber de qual lugar a dor pulsa mais forte. Mas é possível sim encontrar. É possível sim reconhecer. Existe luz onde hoje habita o terror. É só ir devagarinho encontrando as pessoas certas, a rede de apoio. Olha minhas marcas de automutilação elas estão aqui para me lembrar que eu consegui entender o que a minha dor queria dizer.

Não a enfrentei em uma queda de braço, porque eu sempre perdia. Ela tinha as armas, as ferramentas, os motivos, tudo. Com ajuda eu consegui ouvi-la e ela sentou ao meu lado para conversar.

Hoje eu olho para as cicatrizes e me orgulho da dor superada. No presente amiga de trevas e de luz. Então se leu até aqui deixa um coração amarelo e aquece o meu. Eu deixo um aqui para você 💛 e o meu apoio.

Não é errado querer se livrar da dor, mas morrer para se livrar dela é deixar de aprender a conviver e a viver sabendo que ela dói, faz sofrer, mas também ensina que o que faz doer também pode fazer sorrir.

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© Podia ser cor de rosa • Ilustração por Juliana Rabelo Desenvolvimento com por