06/08/2019

A beleza nos olhos de quem não vê

Ana Carolina Carvalho

Quando eu conheci o Rafael não sabia como me portar. Precisava entrevistá-lo para uma matéria especial sobre a gráfica braile do Governo do Ceará e não sabia o que fazer. A primeira gafe foi estender a mão, se ele não vê como iria saber que gesto eu estava fazendo? Ele bem humorado respondeu a todas as perguntas e percebeu pela minha voz o meu desconserto. Conseguiu me descrever assertivamente nas minhas características físicas, como estatura, tipo de cabelo, peso. Mas ele foi além, conseguiu me enxergar sem ver. E o melhor: conseguiu me mostrar a beleza do mundo que mesmo eu vendo não conseguia enxergar. O Rafael não é vítima dele mesmo. Ele trabalha, estuda, anda de ônibus, vai ao shopping, tem uma vida que não é restrita a falta de estrutura da cidade e do estado para acolhe-lo. Viramos amigos, o entrevistei novamente para o meu TCC da pós sobre o mercado de varejo voltado para as pessoas com deficiência. Entrevistei os amigos dele, entrevistei também surdos e cadeirantes. Todos eles pedindo inclusão, pois para entrar em um provador de shopping os cadeirantes não conseguem, nem sequer pegar uma roupa, pois os cabides são altos e inacessíveis. Os surdos não conseguem conversar para serem atendidos, pois o número de pessoas que sabe linguagem de sinais é pouco. Os cegos não conseguem entender o que os vendedores falam, pois os mesmos, assim como eu no início, não sabem como se portar e outras vezes os ignoram. Aprendi e aprendo com o Rafael que as limitações são sobre não saber ver além do que o olho mostra. É não enxergar além do que se vê, literalmente. Aprendo com ele diariamente a ter fé. Uma fé de ficar no escuro e ainda assim caminhar. Uma fé que sabe que nunca se estará sozinho porque Deus sustenta. Uma fé que se faz enxergar mesmo sem ver nada. Rafael, meu amigo, obrigada por ver a vida em tons que eu não consigo alcançar. Obrigada por me ensinar a beleza por meio do seu olhar. Por ser um homem íntegro, do bem, esforçado sem ser vítima de si mesmo e da sociedade em que vivemos. Obrigada por me mostrar Deus a cada dia. .
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E você? Consegue ver a beleza por meio dos seus próprios olhos?

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© Podia ser cor de rosa • Ilustração por Juliana Rabelo Desenvolvimento com por